quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

A EDUCAÇÃO NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS: VALORIZADA OU NEGLIGENCIADA?


 


É uma Constituição marcada pela desregulamentação, flexibilização e qualidade total como elementos da privatização.


No que se refere à Constituição de 1988, podemos dizer que ela apresenta, em relação às demais Cartas, o mais longo capítulo sobre educação. No entanto, muitas conquistas consubstanciadas no texto o relator colocou a exigência da regulamentação em lei específica.
Por: Rubens da Silva Castro
       Diferentemente da Constituição dos Estados Unidos da América, de 17 de setembro de 1787, que tem apenas 10 artigos e 10 emendas, formando a Carta de Direitos, o Brasil, com a Carta Magna de 1988, completou oito constituições. Três delas foram outorgadas (impostas pelo Executivo: 1824, 1937 e 1969). As de 1891, 1934, 1946 e 1988 foram promulgadas (votadas no Congresso Nacional). A Constituição de 1967, sancionada pelo Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, primeiro Presidente do Regime militar pós 64, foi pensada por uma equipe de especialistas na área do Direito. Sua tramitação, no Congresso Nacional, fez-se sob rigoroso controle dos militares golpistas.
       A educação, na Constituição Brasileira de 1824, está restrita a dois parágrafos de um único artigo. “A inviolabilidade dos direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros [...] é garantida pela Constituição do Império pela maneira seguinte: Parágrafo 32 – A instrução primária é gratuita a todos os cidadãos; Parágrafo 33 – Colégios e universidades, onde serão ensinados os elementos das ciências, belas letras e artes” (Art. 179).
       Como pode ser observado, estes são os únicos dispositivos relacionados à temática educação, o que é um indicador da não preocupação dos governantes, naquela materialidade histórica, com o campo educativo. Tratava-se, na realidade, de um preceito formal, uma vez que a Igreja Católica dominava o sistema educacional que deveria preparar seus próprios quadros e também os das elites.
       A primeira Constituição Republicana (1891) estabeleceu a organização federativa da República, concedendo “a mais absoluta autonomia aos Estados da Federação” (SILVA, 1985, p.29). Declara, ainda, como competência do Congresso Nacional “legislar sobre [...] O ensino superior e os demais serviços que na capital forem reservados para o governo da União” (Art.34, XXX). O referido instrumento jurídico separou o Estado da Igreja. Outra questão a se destacar, no que diz respeito à educação, é a laicidade do ensino. Em seu art. 72, Parágrafo 6º, diz “será leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos”.
       Observa-se que a Constituição de 1891, apesar de construída de maneira democrática, no que se refere ao ensino, pouco se propôs. Silenciou quanto à gratuidade e à obrigatoriedade do ensino.  Transferiu a responsabilidade pela educação elementar para as unidades federativas. No século XX, que pode ser considerado como o século das preocupações com as questões sociais, surge a constituição de 1934, a mais avançada de todas as constituições brasileiras, dentro da perspectiva da democratização da oferta da educação pública.
       Nesse instrumento jurídico foi acrescentado títulos de fundamental importância que não estavam contemplados nas Cartas anteriores. Ex: capítulo sobre educação e cultura. Resumidamente, apresentamos algumas diretrizes para a educação consubstanciadas na Constituição de 1934: assegurou o financiamento do ensino, mediante as vinculações tributárias, em percentuais que vão de 10% nas esferas da União e dos Municípios a 20% nas dos Estados e Distrito Federal; instituiu concurso público de provas e títulos para o provimento de cargos do magistério oficial etc.
       Pela amostra dos princípios acima, a Constituição de 1934 era uma Carta cheia de minúcias e ricas em inovações. Teve pouco tempo de duração (três anos), em virtude do advento dos Estado Novo. Vários de seus dispositivos não chegaram a entrar em vigor. A Constituição de 1937, instituída durante a ditadura de Getúlio Dornels Vargas, inspirou-se nas Constituições de regimes fascistas europeus. Muitos dispositivos desta Carta não foram implementados, posto que seu “segredo estava nas disposições finais e transitórias” (FAUSTO, 1996, p. 365), que concedia amplos poderes ao Presidente da República. A este competia: nomear os interventores nos estados; demitir funcionários civis e militares; governar mediante expedição de decretos-leis; etc.
       Para o setor educacional, determinou o seguinte: criou a educação profissional para os operários; ratificou os privilégios já existentes, desde o período colonial, para a educação superior, centralizou o ensino nas mãos da União; concedeu privilégios às escolas particulares. Portanto, a Constituição de 1937 fortaleceu o sistema privado de ensino e a educação pública foi relegada a plano inferior.
       Em 1945, com o processo de redemocratização do país, foi eleita uma Assembléia Nacional Constituinte objetivando a elaboração de uma outra Carta Magna, que foi promulgada em 18 de setembro de 1946. Era um texto fiel às linhas gerais do liberalismo clássico e representou “[...] avanço pequeno relativamente às anteriores de 1891 e de 1934, sobretudo se for considerada a profunda mudança verificada no país de 1930 em diante. Reafirma os princípios liberais daqueles documentos, incorpora à legislação social feita sob o Estado Novo [...] não mais (EGLÉSIAS, 1985, p.63).
       Quanto à educação, esta Constituição retoma o espírito da Carta Magna de 1934. Estabelece a competência da União para “legislar sobre as Diretrizes e Bases da Educação Nacional” (Art.5º, XV). A educação reaparece como direito de todos. Afirma que “o ensino dos diferentes ramos será ministrado pelos Poderes Públicos e é livre à iniciativa privada, respeitadas as leis que o regulem” (Art. 167). Definiu a obrigatoriedade e a gratuidade do ensino primário oficial, composto de cinco anos, conforme estabelecia a Lei Orgânica do Ensino Primário. No seu Art. 168, II dizia que “O ensino primário oficial é gratuito para todos: o ensino oficial ulterior ao primário sê-lo-á para quantos provarem falta ou insuficiência de recursos”.
       Pelo exposto, e analisando outros textos constitucionais, percebe-se que é a primeira vez que a expressão “ensino oficial” aparece num documento legal. Além disso, existia ampla possibilidade do ensino oficial não ser gratuito, haja vista que a referida Constituição declarava que a instrução após o primário seria gratuita somente para aquelas pessoas que provassem falta ou insuficiência de recursos. Esta atitude retira, pelos menos, parcialmente, o caráter público da educação. O Senador da República Federativa do Brasil e candidato à Presidência do país pelo PDT – DF Cristovam Buarque retoma esta proposta para a universidade brasileira. Trata-se de uma universidade meio pública. É como se fosse possível alguém estar meio apaixonado, trocar meio beijo e dar meia namorada... Na realidade, a Constituição de 1946 inovou muito pouco em matéria de educação.
       A Constituição de 1967 foi imposta pelo regime ditatorial. Assegurou a obrigatoriedade do ensino dos sete aos quatorze anos, mas excluía aqueles que extrapolassem os limites fixados. Valorizou o ensino privado que recebeu toda a assistência técnica e financeira; não definiu os percentuais obrigatórios de recursos públicos para a educação. Esse instrumento jurídico marca o início dos acordos internacionais de cooperação entre o governo brasileiro, através do MEC, e o governo norte americano, através da USAID, Agência Internacional para o Desenvolvimento, que reformulou a educação no Brasil em todos os níveis. O nome de Rudolf Atcon, estreitamente vinculado à agência, esteve presente, também, nas reformas do ensino de vários países latinoamericanos que estavam dominados por regimes militares.
       No que se refere à Constituição de 1988, podemos dizer que ela apresenta, em relação às demais Cartas, o mais longo capítulo sobre educação. No entanto, muitas conquistas consubstanciadas no texto o relator colocou a exigência da regulamentação em lei específica. Como exemplo citamos a questão da gestão democrática do ensino público. (Art. 206, VI.). Apenas o ensino fundamental é obrigatório. O ensino médio terá a sua gratuidade atendida progressivamente. Silenciou quanto à gratuidade no ensino superior. É uma Constituição marcada pela desregulamentação, flexibilização e qualidade total como elementos da privatização. 

Rubens da Silva Castro e Jorge Gregório da Silva, professores da UFAM.
     

Um comentário:

  1. Meu querido Rubens da Silva Castro. Parabéns pelo Blog! Gostaria de solicitar que você acrescentasse meu nome como co-autor que fui em todos os textos que publicamos juntos no Jornal do Commercio, os quais se encontram registrados no meu Currículo Lattes, e que se encontram nesse Blogo somente com o seu nome. Caso você não lembre quais textos fizemos juntos, basta acessar o meu Currículo Lattes pois lá constam todos os textos, mas se por acaso tenho todos os exemplares do Jornal do Commercio. Solicito essa ratificação porque usei alguns de nossos artigos em publicações científicas, as quais foram questionadas pelo Comite Científico das Revistas como sendo PLÁGIO, tendo em vista os motivos supracitados.

    Um abraço fraterno
    Prof. Dr. Elizeu Vieira Moreira

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